Mais de 100 países devem celebrar neste domingo, 8 de março, o Dia Internacional da Mulher. No avanço dos direitos das mulheres, os países nórdicos são os incontestáveis líderes globais. Islândia, Noruega, Finlândia e Suécia ocupam, nessa ordem, os quatro primeiros lugares da nova edição do Global Gender Gap Report, relatório do Fórum Econômico Mundial que todo ano aponta quais são os melhores países do mundo para as mulheres viverem.
Em outros comparativos do gênero, como os elaborados pelo Banco Mundial, pela Georgetown University e pela organização Equal Measures 2030, os países da região também se sobressaem. E o protagonismo não é de hoje. Dinamarquesas, finlandesas, islandesas, norueguesas e suecas muitas vezes mostraram o caminho para a busca da igualdade de gênero em outras partes do mundo. Seja em lutas individuais, seja em conquistas coletivas, as escandinavas têm sido pioneiras nesses esforços desde a Era Viking.
O Scandinavian Way conta a seguir cinco vezes em que as escandinavas abriram as portas para a conquista de direitos.
Islândia é o primeiro país a eleger uma mulher para presidente
Até 1980, nenhuma mulher havia chegado à presidência de um país por meio de eleições gerais. Quem mudou isso foi Vigdís Finnbogadóttir, que conquistou a presidência da Islândia superando também o que muita gente veria como estigma: o de ser uma mulher divorciada e mãe solteira (ela foi, a propósito, a primeira mulher solteira de seu país a adotar uma criança).
Professora de francês e diretora artística antes de entrar na vida pública, a islandesa tornou-se uma presidente muito popular, sendo reeleita em 1984, 1988 e 1992. Em 1996, ela decidiu não concorrer a um novo mandato, mas seu trabalho pelo fortalecimento do papel das mulheres na sociedade não parou. Naquele mesmo ano, ela foi uma das fundadoras e primeira presidente do Conselho de Mulheres Líderes Mundiais, criado na escola de governo John F. Kennedy, da Universidade de Harvard.
Finlândia é o primeiro país a ter parlamentares mulheres
A Finlândia foi o primeiro país do mundo em que, além de votar, as mulheres passaram a poder também concorrer nas eleições. Esse direito foi assegurado em 1906 e entrou em vigor no ano seguinte, quando o Parlamento foi renovado. Nessa eleição histórica, 19 finlandesas tornaram-se as primeiras parlamentares de seu país – e do mundo – por decisão do povo.
Ainda um grão-ducado autônomo do Império Russo na ocasião, a Finlândia só conquistaria sua independência em 1917, mas foi somando avanços sociais até lá. O direito das mulheres de concorrer ao Parlamento fez parte de um conjunto de conquistas mais amplo: as mudanças ocorridas em 1906 asseguraram o direito ao voto a todos os cidadãos adultos do país, independentemente de gênero, classe, riqueza ou posição social.
A dinamarquesa que abriu caminho para a aceitação das mulheres trans
Lili Ilse Elvenes, mais conhecida como Lili Elbe, foi uma mulher trans em um tempo em que sequer havia termo apropriado para designar pessoas que nascem com características biológicas de um gênero, mas que não se identificam com ele. No início dos anos 30 do século passado, Lili foi uma das primeiras mulheres trans do mundo a fazer cirurgias de redesignação sexual, que ainda eram altamente experimentais. Seu pioneirismo incluiu o direito de mudar seu nome legalmente – em seu passaporte, ela passou a ser identificada como Lili Ilse Elvenes.
Uma versão ficcional da história de Lili Elbe foi contada pelo escritor americano A Garota Dinamarquesa, um campeão internacional de vendas lançado em 2000. A obra foi adaptada para o cinema em 2015, com o inglês Eddie Redmayne no papel de Elbe.
Noruega cria ouvidoria de igualdade de gênero, inédita no mundo
Na segunda metade do século 20, a norueguesa Eva Kolstad foi uma figura central no avanço das políticas de igualdade de gênero não só em seu país, mas globalmente. Para aprofundar esses esforços, a Noruega criou em 1979 o cargo de ombudsman de igualdade de gênero, o primeiro do gênero do mundo, que atuaria como uma ouvidoria pública para reduzir a desigualdade entre homens e mulheres. Eva Kolstad foi a primeira titular do cargo, no qual ficou até 1988.
Antes disso, entre outras frentes, ela atuou por mais de uma década como presidente da Associação Norueguesa dos Direitos da Mulher e vice-presidente da Comissão das Nações Unidas sobre a Situação da Mulher (1969-1975). A norueguesa participou ativamente do desenvolvimento das políticas de igualdade de gênero da ONU.
Mulheres não acusavam homens de agressão. Uma sueca mudou isso – e venceu
Em muitas partes do mundo, ainda hoje são poucas as mulheres que denunciam crimes contra elas como tentativa de estupro e agressão. No século 19, então, essas denúncias virtualmente inexistiam. Mas Sophie Sager ignorou as estatísticas, superou a vergonha de se expor e o medo do julgamento público de que certamente seria alvo para enfrentar seu agressor nos tribunais. E ela venceu. E, na esteira desses esforços, transformou-se em um símbolo internacional de conscientização das mulheres na luta por seus direitos.
Em 1848, Sophie, que na ocasião trabalhava como governanta, foi a Estocolmo para aprender a bordar e, quem sabe, abrir uma loja para melhorar a renda da família. Com pouco dinheiro, aceitou a oferta de um conhecido para ficar em sua pousada. Ela alugou o quarto, e, mais tarde, o homem entrou nele para tentar estuprá-la. Conhecido apenas como Möller, ele a agrediu com violência, mas ela revidou, conseguiu se desvencilhar e fugir do local.
Na fuga, Sophie encontrou um médico, que a examinou e a convenceu a denunciar o agressor à polícia, o que levou o caso aos tribunais. Lá, Sophie fez sua própria defesa, baseada nos depoimentos do médico sobre as condições em que ela estava logo após o ataque. Os argumentos convenceram a corte, e Möller foi declarado culpado das agressões e da tentativa de estupro.
O caso teve grande repercussão na Suécia. A projeção fez Sophie viajar pelo país para fazer palestras sobre sua experiência e sobre a importância de as mulheres lutarem por seus direitos. Ela escreveu um livro autobiográfico sobre o episódio, lançado em 1852, e em 1855 mudou-se para os Estados Unidos. Lá, tornou-se uma influência para o ainda incipiente movimento de luta pelos direitos das mulheres.